Olhos que transbordam
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terça-feira, 7 de outubro de 2008
Ela caminhava pela calçada encarando a montoeira de olhares. Olhos azuis, castanhos, puxados, tristes, alegres e apreensivos. Quantos olhos compõem uma rua! Quantos olhares compõem uma cidade! Isso a aterrorizava e encantava, era um paradoxo incrivelmente belo. A menos de um passo a tristeza, a menos de um quarteirão a alegria. Como podia tantos sentimentos, tantas vidas apressadas, caminhando pelas ruas com olhares que transbordam e passos de robôs? Tudo transbordava. Uma moça com lágrimas nos olhos transbordava dor, um rapaz de olhar brilhante transbordava amor. Ela queria acolher em seus braços a dor de alguns olhos e compartilhar o amor de outros. E aqueles inexpressivos? Esses sim davam medo. Ela queria navegar na alma dos desafortunados sem expressão. Como podia um olhar não ter significado? Como podia um par de olhos ser neutro? Mas aí veio um tropicão e o rosto de um rapaz: ah, que belos olhos! Eram dois olhos de encanto, de brilho. Mas a fração de segundos de um passo desviou os olhares, afastou os corpos, cabeças viraram para a última fitada e ela se deparou com a vitrine de uma loja. Um espanto: o seu próprio reflexo. Alguns minutos se passaram e ela ainda estava lá tentando decifrar o significado de sua expressão... Tanta gente, tantos olhos, tantos sentimentos e ela tinha simplesmente se esquecido que também fazia parte da multidão. Uma multidão de cores e significados intercalados com a sutileza de um piscar. Então ela piscou, sorriu para seu reflexo e partiu.
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